MAIORIDADE PENAL: CARDOZO ERRA, CCJ DA CÂMARA ACERTA
MAS VAI LONGE DEMAIS E RADICALIZA
Jorge Béja
O ministro da Justiça bate na
mesma tecla, desafinada, quando o assunto é a redução da maioridade penal.
Diz Cardozo que essa questão é "norma pétrea constitucional" e, por
isso, não pode ser alterada. Está errado, ministro. Normas constitucionais
pétreas não são as que o intérprete da constituição e as autoridades
políticas de ocasião querem que sejam pétreas. É a própria Constituição
que indica quais são suas normas imutáveis, insusceptíveis de serem abolidas, o
que não significa dizer que não possam ser alteradas. O verbo que a
Constituição utiliza é o abolir. Não, alterar. E não são muitas. São
apenas quatro. E entre elas não se encontra a redução da maioridade penal.
NORMAS QUE SÃO PÉTREAS
Tudo está muito claro no
Artigo 60, § 4º, da Constituição Federal, assim disposto: "Não será objeto
de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto,
universal e periódico; III - a separação dos
Poderes; IV - os direitos e
garantias individuais". Aí a Constituição para e
não indica quaisquer outras matérias, temas, assuntos e
princípios sobre os quais também recairia a proibição de serem abolidas,
isto é, suprimidas da Constituição, sobretudo porque as pesquisas
indicam que a maciça maioria do povo não deseja a abolição da inimputabilidade
penal, mas apenas sua redução. E aqueles quatro princípios que
são imutáveis (pétreos) se encontram inscritos logo no início da
Constituição, do artigo 1º ao artigo 5º, este último com 78 enunciados, elencados
em algarismos romanos, mas nenhum deles referentes à questão da
inimputabilidade penal.
O ARTIGO 228 DA CF
A questão da maioridade penal
está lá no finalzinho da Constituição, em seu artigo
228, assim redigido: "São penalmente inimputáveis os menores de
dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial".Portanto, não é
norma pétrea, como pétrea também não é sua norma vizinha, a prevista do artigo 226, § 3º, que somente admite o
casamento entre homem e mulher. Tanto não é pétrea que o STF, sem
competência para legislar, decidiu, em 2013, oficializar o casamento
entre pessoas do mesmo sexo, na contramão da guarda e preservação do
referido artigo constitucional que diz: "Para efeito de proteção do
Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher, como entidade
familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento".Assim,
casamento apenas entre homem e mulher não é norma pétrea, bem como a
inimputabilidade penal também não é.
ACERTO E RADICALIZAÇÃO
Mas a decisão recém
aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos
Deputados, apesar do acerto da desconsideração da inimputabilidade penal como
norma pétrea, a decisão foi longe demais. Radicalizou. Reduziu de 18 para 16
anos de idade a maioridade penal. Para todos. Sem exceção. Sem piedade.
Generalizou o que não poderia e nem pode ser generalizado. Se o Poder
Público não tem condições de reeducar seus adolescentes
infratores, transformando-os em pessoas de bem e para o bem e,
antes disso e mais que isso, preparando-os com sólida e eficaz
política educacional para que não se tornem jovens bandidos, colocá-los,
todos, no cárcere, nas enxovias nacionais é uma tremenda barbaridade. É
maldade. É impiedade e falta de compaixão. É o mesmo que matar a
pessoa que sofre de dor intensa e insuportável -- a morte elimina a dor
-- por não dispor o Poder Público do atendimento médico para tratar e
acabar com a dor. É covardia. É outro crime. Crime oficial e hediondo.
ALTERNATIVA PLAUSÍVEL, TALVEZ
É desnecessário alterar o
texto constitucional do artigo 228. Que se mantenha a maioridade penal a partir
dos 18 anos de idade. E para não radicalizar, nem generalizar, basta
acrescentar apenas um parágrafo ao referido artigo, a fim de
considerar os maiores de 16 e menores de 18 anos presumidamente
inimputáveis. A inimputabilidade presumida obrigaria a Autoridade Judicial
(o Juiz da Vara da Infância e Adolescência), imediatamente após receber o Auto
de Apreensão e sem delongas, a proceder, de imediato, a exames,
médico e psicológico, para aferir se o menor infrator apreendido, dentro
daquela faixa de idade, tem ou não plena ciência e consciência do ato
infracional que praticou. Se o laudo resultar negativo, o apreendido
continua inimputável e sujeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
mantida a competência do Juiz da Vara da Infância para decidir seu
destino. Caso o laudo resulte positivo, a competência, então, se
desloca para o justiça comum, seja a vara criminal, seja o Tribunal do
Juri, conforme o delito cometido. Afinal --- e está no Código Penal ---
inimputável é o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento ( CP, artigo 26 ).
E o artigo 228 da Constituição Federal passaria a ter a seguinte
redação:
"ARTIGO
228 - São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às
normas da legislação especial.
Parágrafo Único - A inimputabilidade penal dos
menores de dezoito e maiores de dezesseis anos é presumida e quando elidida,
sujeitam-se aqueles à legislação penal comum".
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