terça-feira, 15 de março de 2011

A PRISÃO É UM PAIOL DE POLVORA – ÓDIO EM CIMA E EMBAIXO...


Eu era presidente da Comissão Nacional de Diretos Humanos da OAB, quando fui convidado pelo Governo Bill Clinton a visitar oficialmente os Estados Unidos. Foi uma das experiências mais importantes de minha vida.

Algo que me impressionou muito foi verificar no Estado de Illinois, precisamente no Condado de County, Chicago; que a sociedade pagava multa de diária de mil dólares, porque faltava cama para um preso. Um preso, apenas!

Fiquei pensando na situação aqui no Brasil, onde mais de 300 presos, às vezes, disputavam os metros quadrados em que, no máximo, caberiam 20 pessoas comprimidas pelo ódio, em cima e embaixo...

Pois a providencia está para chegar aqui. O Supremo Tribunal Federal colocou a bomba relógio no colo do Ministro Ayres de Brito. Mês passado o plenário virtual da mais alta corte brasileira reconheceu “repercussão geral” num recurso extraordinário da Defensoria Pública Estadual do Mato Grosso do Sul, pleiteando que o estado pague indenização por dano moral aos presidiários e presos provisórios submetidos a tratamento desumano e degradante, por conta da superlotação carcerária...

Primeiro advogado brasileiro que vi postular indenização por um preso comum e vencer a demanda foi o jurista carioca Jorge Beja, defendendo interesses da família de Fernando Gomes de Carvalho, “o português” Fernando-CO, casado com Kátia Lúcia Vilar Lyrio, irmã de Lucio Flávio; por entender que ao homem privado da liberdade eram devidas todas as garantias à vida e à dignidade. E não foi apenas essa ação. Foram 33 processos em que defendeu gratuitamente os interesses de familiares de presos assassinados nas celas, dos quais venceu 31 e perdeu 2.

Perguntei certa vez por que fazia isso e por que deixou de fazer. Beja respondeu que lutou pelo ideal de ver o Estado brasileiro melhorar o sistema prisional. Mas como viu que a resposta foi banalizada com o simples valor indenizatório, desistiu.

A causa proposta pelos defensores é nobre e humanitária. Mas uma eventual decisão em favor dos presos certamente não será popular. A opinião pública vai gritar quando sentir arrancado de seu bolso o preço da desídia do poder estatal, na prática de um pseudo programa socioeducativo em prol da recuperação do homem degradado.

A “repercussão geral” é um instrumento processual criado pela emenda da reforma do judiciário de 2004. Possibilita ao Supremo selecionar recursos extraordinários que por sua relevância, devem ter prioridade no julgamento, obrigando que, sequencialmente as demais instâncias adotem o mesmo entendimento.

Os Estados poderão falir, é bem verdade. Mas quem sabe, dessa vez, criem condições melhores para os presos. Passem de fato a recuperá-los, impedindo a formação de verdadeiro paiol de pólvora que, como definiu Graciliano Ramos em ‘Memórias do Cárcere’, é o inferno que comprime ódio, em cima e embaixo...

Mas francamente, não queria estar na pele do Ministro Ayres de Brito.

Falei e disse!

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