OPINIÃO
IMPEACHMENT: PRESIDENTE DA COMISSÃO
COMETE ERRO PROCESSUAL GRAVÍSSIMO
Jorge Béja
O curso, etapas e fases de todo e qualquer processo na ordem
jurídica nacional sujeitam-se ao regramento previsto em lei. Impechment, seja
quem for a autoridade acusada, é processo, com rito próprio, conforme disposto
na Lei nº 1079/50 e às determinações que o Supremo Tribunal Federal expediu ao
julgar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 378, da autoria do
PCdoB, ao fazer as adequações daquela antiga lei às normas da Constituição
Federal de 1988. A autoridade que preside qualquer processo deve seguir o que
diz a lei, ainda que a autoridade detenha o poder da condução formal e material
do pleito que preside. É assim no Judiciário e também é assim fora dele. Nada
pode ser improvisado. E também nada pode pegar de surpresa uma ou todas as
partes que se enfrentam. Surpresa é fato ou ato incompatível com a regularidade
e lisura que um processo exige. Nos pleitos que versam sobre Direito do
Consumidor, por exemplo, a Lei Consumerista dá ao juiz o poder de inverter o
ônus da prova em prol do consumidor. Porém, o magistrado para fazer uso dessa
prerrogativa deve avisar, antecipadamente, a todas as partes envolvidas. Sem
este aviso prévio, a inversão não se sustenta. E a sentença que sobrevier,
calcada na inversão sem prévio aviso, é sentença nula.
CARDOSO, NOVAMENTE
Na sessão de ontem da Comissão Especial que examina a
denúncia que os juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal
assinaram pedindo o afastamento de Dilma da presidência da República, o
deputado Rogério Rosso, que até aqui tem primado pela serenidade e fidalguia,
anunciou durante a sessão que o Advogado-Geral da União, José Eduardo Cardozo,
voltará a falar à Comissão na próxima segunda-feira, antes da votação final.
Justificou que era um gesto seu de "liberalidade e consideração" com
o referido ministro, defensor de Dilma. O Globo de hoje, sábado, assim noticia:
"O presidente da comissão, Rogério Rosso (PSD-DF), abriu espaço para que o
advogado da União, José Eduardo Cardozo, fale novamente na segunda-feira, antes
da votação. O governo acusava a comissão de cercear o direito de defesa".
TODOS, OU NENHUM
Nada disso, deputado Rogério Rosso. Sua decisão está
erradíssima. Primeiro porque o direito de defesa da presidente Dilma não foi
cerceado. Muito pelo contrário, foi ampliado consideravelmente. Na defesa de
Dilma, Cardozo já falou à Comissão por duas horas seguidas.E no dia anterior, o
ministro da Fazenda e um professor da Uerj também foram à Comissão defender
Dilma. Ao passo que à acusação foi concedida apenas uma hora: meia hora falou
Reale Júnior; e na outra meia hora falou Janaína Paschoal. Segundo porque, seu
gesto de liberalidade deve ser equitativo para as partes que se enfrentam, sob
pena de nulidade, em razão da disparidade de armas, condições e situações. Para
corrigir este gravíssimo erro, ou o senhor recua e reconsidera este segundo
chamamento do ministro Cardozo, ou o senhor deverá também convidar, o mais
rapidamente possível, Reale Júnior e Janaína Paschoal para que voltem
segunda-feira à Comissão e falem aos deputados pela última vez. Onde já se viu
isso, dar à defesa de denunciada um direito que a defesa não tem? Ou chama
todos ou não chama mais ninguém.
IGUALDADE DE TRATAMENTO
Todos são iguais perante a lei, diz a Constituição Federal. O
Código de Processo Civil --- fonte sempre subsidiária para disciplinar processo
judicial ou não --- tanto o de 1973 quanto este novo, que há poucos dias entrou
em vigor, determina que o juiz dirigirá o processo incumbindo-lhe assegurar às
partes igualdade de tratamento (Artigo 125, I, do CPC de 1973 e Artigo 139, I,
do CPC de 2016). Nada mudou, deputado Rosso.. E nunca mudará. Ao menos enquanto
perdurar no nosso país o Estado Democrático de Direito e a observância do
devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Ao chamar o ministro
Cardozo para falar mais uma vez à Comissão, sem também chamar os juristas que
assinaram a petição-denúncia contra a presidente Dilma para também novamente
falarem à mesma Comissão, antes ou depois de Cardozo, na próxima segunda-feira,
o senhor comete irreparável erro procedimental, por ferir a isonomia de
tratamento que acusação e defesa têm o direito de receber desta presidência.
A VOZ DO MESTRE
Um dos maiores processualistas do país, José Frederico
Marques anota que "dentro das necessidades técnicas do processo deve a lei
propiciar ao autor e ao réu uma atuação processual em plano de igualdade no processo
e deve dar a ambas as partes análogas possibilidades de alegação e
prova". O que a lei dá, o que a Constituição Federal determina e o
que o senso comum de Justiça exige, o senhor, deputado Rogério Rosso, com uma
canetada pôs tudo a perder. Espera-se que de sua parte o conteúdo deste artigo
leve o senhor deputado, cercado de excelentes assessores-juridicos, a rever sua
decisão. Revogando-a ou mantendo-a. Mas para mantê-la, os doutores Miguel Reale
Júnior e Janaína Paschoal precisam também ser chamados para a sessão da próxima
segunda-feira.
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