domingo, 24 de junho de 2012

Carta a Lugo, desde Rio de Janeiro




 



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Carta a Lugo, desde Rio de Janeiro

Transcribimos una carta enviada a nuestra redacción desde Brasil (en idioma original)

Todos os acontecimentos assisti pela televisão e pela internet, pois sou leitor do La Nación. Seu discurso de despedida da presidência do Paraguay remiu todas as suas faltas como pessoa humana e estadista, fundamentalmente por não ter perseverado na fidelidade ao voto que prometeu cumprir quando, outrora, o senhor recebeu o sacramento da Ordem. Ainda assim, permanece pastor, porque uma vez sacerdote, sacerdote para sempre ("SACERDOS IN AETERNUM").

Seu discurso foi plácido. Semblante sereno e com sorriso nos lábios, o senhor despediu-se do povo paraguaio sem o menor rancor, mas com altivez. Em nome da paz, pediu ao povo que não fizesse enfrentamento, que não houvesse derramamento de sangue, que não reagisse. Deixou o palácio presidencial pela mesma porta que nele entrou, de cabeça erguida e sem olhar o próximo, mesmo os opositores políticos, com malícia ou ressentimento. Sei que suas intenções à frente do govêrno sempre foram altaneiras. Sem ser ditador, mas um democrata, o senhor desejou volver o Paraguai à época áurea de José Gaspar Francia, na primeira metade do Século XIX. Não foi possível, talvez pela inexperiência a respeito das sempre complexas e problemáticas situações que cercam e envolvem um chefe de Estado. Ou pelo cândido credo no próximo, o mesmo credo que despertou no senhor a vocação sacerdotal.

O Estado Paraguaio é soberano, como soberanas são todas as nações. Seu súbito afastamento da presidência foi uma decisão política interna, à qual todos os demais países devem acatar, ainda que se sintam inconformados. Ainda que a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos garanta a qualquer cidadão o direito de ser ouvido, "dentro de um prazo razoável", para se defender contra qualquer acusação e apresentar recurso, caso a decisão não lhe seja favorável. Ainda que a Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela ONU em 10 de Dezembro de 1948, disponha no mesmo sentido.

Agora, o Paraguai tem novo presidente que fará o que o senhor desejou e não pôde realizar e fazer. Na sua grandeza e de ânimo reto, estou certo de que o senhor vai colaborar com o novo presidente, independentemente das posições partidárias, porque Fernando Lugo está acima desses conflitos político-ideológicos. Seu discurso de despedida externou todo o seu caráter, de homem de bem e de pastor que não se afastou de suas ovelhas, mas que por elas, para o bem delas e do Paraguai, foi sobranceiro e respeitoso com o parlamento. Não foi uma derrota. Foi vitória de Fernando Lugo. Por outro lado, a assunção de Federico Franco, em ambiente de paz, é legítima. O Paraguai deu ao mundo um grande exemplo de pacificação política. Erra e erra muito, quem pensa ou diz o contrário. Aqui no meu Brasil, fala-se na exclusão do Estado Paraguaio do Mercosul. É uma barbaridade e total truculência com a nossa querida nação-irmã, já não bastasse a guerra contra o Paraguai, no Século XIX, que nada mais foi do que um genocídio americano, um extermínio. É dever de todo brasileiro, mais ainda de quem está à frente do poder, sentir vergonha daquela brutal e traiçoeira batalha de Acosta Ñu, que simboliza o que foi aquele covarde e ignominioso enfrentamento.

Cordialmente,
do Rio de Janeiro para Assunção,
de Vossa Excelência,
Jorge Béja
(Advogado, inscrição na OAB nº 19.310, Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros, Rua Araújo Pena, nº 30, 1º andar, Tijuca, Rio de Janeiro, CEP 20.260-230

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