ALOÍSIO GOMIDE: UM SEQUESTRO NUNCA CONTADO EM
DETALHES
Lembro como se fosse hoje do sequestro do cônsul
brasileiro Aloísio Gomide, em Montevidéu, por guerrilheiros Tupamaros (Taupac
Amaru) em 1970. Acho que agora, 44 anos depois posso contar detalhes dessa
história que ninguém nunca ninguém contou.
Eu e o jurista carioca Jorge Béja, ainda
antes da advocacia, éramos repórteres da Rádio Nacional do Rio de Janeiro
quando foi dada a notícia do seqüestro.
Os
tupamaros exigiam 1 milhão de dólares para o resgate. Dona Apparecida Leal Pena
Gomide, mulher do cônsul, veio para o Brasil. Chegou perto das 3 da madrugada
no velho Galeão. Béja, primeiro a dar a notícia, foi escalado para a cobertura.
Ele e toda a imprensa carioca seguiram em comboio - o carro dela até a casa de
um irmão, chamado Marcos, que morava na Rua São Miguel, alto da Tijuca.
Por
volta das 5 horas da manhã todos foram convidados a entrar na casa para uma
entrevista coletiva. Béja ficou ao lado de Dona Aparecida porque segurava o
microfone do gravador da Rádio. Nas fotos do dia seguinte nos jornais
apareceram ela e ele.
A
mulher do cônsul brasileiro informou que viera ao Brasil coletar dinheiro.
Béja enfiou a mão no bolso e deu a ela a única nota que tinha (10
cruzeiros novo) e disse: "Dona Aparecida, está aberta a
campanha". No dia seguinte a notícia: “Mulher de cônsul vem ao Brasil
arrecadar dinheiro para libertar o marido e repórter doa seu salário para abrir
a campanha”.
O
gesto uniu as famílias Béja e Gomide até hoje. Aloysio e Aparecida foram
padrinhos do casamento de Jorge e Clarinda Béja, a 4 de Julho de 1971. A
notícia saiu na 1ª página do Globo e a Igreja Bom Jesus do Calvário
na Tijuca ficou apinhada de gente para ver a primeira aparição pública do
cônsul libertado pouco antes, no carnaval de 1971.
A
liberdade de Aloísio Gomide aconteceu num domingo. Béja estava de plantão na
Rádio quando dona Aparecida ligou de Montevidéu e colocou o cônsul ao telefone.
A entrevista foi ao ar ao vivo às 11 da noite. Depois a Nacional a repetiu várias vezes.
O
que vou contar agora, nunca ninguém contou, realmente. Sei que a família não
gosta. Muito menos meu querido amigo Béja.
Talvez por conta da dor e do pânico que tudo isso representou.
O
dinheiro do resgate foi arrecadado. Dois Tupamaros vieram ao Rio de
Janeiro contá-lo e lacrar os pacotes. Isto foi feito na casa de um parente de
Aloysio Gomide na rua Carlos Góis, em
Ipanema. Depois, autorizado secretamente pelo ministro das relações
exteriores Gibson Barbosa, o dinheiro foi levado de ônibus do Rio para uma
pracinha em Montevidéu. Quem levou o os pacotes com os valores foi uma senhora
de idade, em dois sacos de supermercados. A senha para entregar o dinheiro
foi beijar um crucifixo. Entregue o resgate pela manhã, Aloísio Gomide foi
solto à noite.
Junto
com ele tinham sido sequestrados o engenheiro agrônomo norteamericano Claude
Fly e outro americano, Dan Mitrione, que foram mortos no cárcere. Aloysio foi
preservado e solto.
Conto isso agora, 44 anos depois. Coisas do tempo do Repórter Nacional, sucessor do Esso, testemunha ocular da história...
Conto isso agora, 44 anos depois. Coisas do tempo do Repórter Nacional, sucessor do Esso, testemunha ocular da história...
Falei e disse!
Parece-me que o crime compensou. Tupamaro ocupa a presidência do Uruguai hoje, não?
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