A IMAGEM DO CRISTO NO
CORCOVADO NÃO É PROPRIEDADE DA IGREJA.
É DO POVO DO RIO, DO BRASIL E DO MUNDO.
Jorge Béja
O
Globo de hoje, 8 de junho de 2014, publica notícia de sua correspondente
Deborah Berlinck (Itália) na qual informa que "A
Arquidiocese do Rio está pedindo uma indenização de 5 a 7 milhões de euros
(cerca de R$15 milhões a R$21 milhões) à maior rede de televisão da Itália, a
RAI, que vestiu o Cristo Redentor com uma camisa da seleção italiana de futebol
num filme para promover sua participação na Copa do Mundo". Segundo a notícia, "a Arquidiocese acusa a rede
italiana de exploração ilícita da imagem de Cristo, lembrando que é dona
exclusiva dos direitos autorais, materiais e morais do monumento". Para o advogado Alexandro Maria
Tirelli, que representa a Igreja do Rio, "A Arquidiocese se sente
ultrajada".
PRIMEIRA CONSIDERAÇÃO
A
iniciativa não é simpática, ainda mais sob o pontificado de Francisco. Tem a
Igreja --- e temos todos nós --- interesse e legitimidade para defender as
imagens e símbolos da fé cristã contra quem as conspurcam. Mas a intenção
da RAI não traz a mínima carga de ofensa, de conspurcação, mas apenas a de
promover a participação da Itália na Copa do Mundo-Fifa que se realiza no
Brasil. Nada mais que isso. Segundo se deduz da notícia, a imagem do
Cristo Redentor no Corcovado não é
ultrajada, menosprezada, ridicularizada, nem muito menos caricata. É
apenas a imagem vestida com a camisa da seleção italiana de futebol. Isso não é
sacrilégio, nem profanação. O Direito Brasileiro tem suas raízes
assentadas no Direito Romano, no Direito Italiano, no Direito
Francês, mais especificamente no tocante ao Direito das Obrigações. E
neste campo da Responsabilidade Civil, na Itália, na França e no Brasil, a
intenção é preponderante para aferir se o infrator obrou ou não com
a vontade deliberada de ofender. Não se pode avistar no gesto da RAI
tal propósito. A Responsabilidade Civil, em tais situações, não é
objetiva, mas subjetiva. Exige a investigação em torno da culpa, da
intenção. Também a emissora não tira o menor proveito econômico com o
filme que exibe. Não passa de um estímulo para os italianos torcerem
para a sua seleção de futebol e, subjacentemente, a divulgação da
Copa. E se igual incentivo partisse de uma televisão brasileira, a Arquidiocese
do Rio teria a mesma reação de ir à Justiça com pedido de indenização?
SEGUNDA CONSIDERAÇÃO
O
que aconteceu décadas atrás foi diferente. Um intitulado bispo da Igreja
Universal de Edir Macedo chutou a imagem de Nossa Senhora Aparecida, num
12 de Outubro, dia consagrado à santa. A agressão foi mostrada pela Tv
Record. Da minha parte não cruzei os braços. Era um sábado (ou
domingo, salvo engano) e eu próprio fui à casa do Juiz Doutor Célio Geraldo de
Magalhães Ribeiro, no bairro Laranjeiras, apresentei uma petição para que
a cena não se repetisse e fosse determinada a abertura de inquérito policial
contra o bispo que chutou a santa. O juiz me recebeu, leu a petição e a
despachou. Mandou intimar a emissora para se abster da prática e ordenou à
polícia que fosse aberto o inquérito policial. Assim que deixei a casa do
juiz, me dirigi à sede da Secretaria de Segurança e entreguei a petição e a
determinação judicial.
TERCEIRA CONSIDERAÇÃO
Também
não se vê êxito nesta pretensão da Arquidiocese do Rio contra a RAI. O
artigo 40 da Lei dos Direitos Autorais(Lei 9.610, de 19.2.1998) dispõe que as obras que ficam expostas em
logradouros públicos podem ser fotografadas, representadas e reproduzidas
livremente: "As
obras situadas permanentemente em logradouros públicos podem ser representadas
livremente, por meio de pinturas, desenhos, fotografias e procedimentos
audio-visuais".
E não dispondo a lei sobre a vedação do uso de tais
reproduções-representações que a lei expressamente permite, a RAI não cometeu
qualquer ilícito, civil e penal. É também oportuno dizer que os artigos 33 e 44
da Lei dos Direitos Autorais que as obras que pertençam ao "Domínio
Público", podem ser
reproduzidas, sendo certo que a imagem do Cristo do Corcovado foi inaugurada em
12 de Outubro de 1931. Há mais de 70 anos, portanto, tempo em que se consolida
o "Domínio
Público".
CONSIDERAÇÃO FINAL
Devemos
crer que a nossa Arquidiocese do Rio de Janeiro venha refletir sobre o
propósito de abrir processo indenizatório contra a Tv da Itália que, de boa-fé,
sem malícia ou mínimo ultraje à imagem do Cristo Redentor no morro do
Corcovado, a veiculou à Copa do Mundo-Fifa, com o exclusivo intuito de
estimular a torcida italiana, até mesmo para que viaje ao Brasil e assista à
Copa. Um pensamento: a imagem de Cristo é de Cristo. Só de
Cristo, que há mais de 2 mil anos nos legou para todos nós,por nós
e por todas e todas as gerações. É um bem, que para a Ciência do Direito é
chamado "Bem Fora de Comércio". E para a fé cristá, um bem sagrado.
Não pode ser alvo de indenização de espécie alguma. Porque já constitui uma
sublime recompensa para a Humanidade.
Jorge Béja, Advogado no Rio de Janeiro
Especialista em Responsabilidade Civil, Pública e
Privada.
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